Fé e Tradição: O Círio de Nossa Senhora de Nazaré na Comunidade do Lavrado, Marajó

Há quase 30 anos, a devoção marajoara reúne moradores e visitantes no Círio do Lavrado, mantendo viva uma tradição que resiste e precisa de apoio.



A Tradição do Círio no Lavrado: Uma História de Fé e Resistência

Na comunidade do Lavrado, região do Anajás Grande, em Ponta de Pedras, Marajó, a devoção a Nossa Senhora de Nazaré se transforma anualmente em um evento que atrai dezenas de fiéis, moradores e visitantes de várias localidades. Neste ano, a celebração seguiu com uma programação semelhante aos outros anos, mas marcada por desafios: devido às reformas na capela da comunidade, a chegada da procissão precisou ocorrer na escola do Lavrado. Mesmo com adaptações, o Círio manteve sua força, reafirmando a fé e a união de uma comunidade que mantém à tradição há quase três décadas.

Leila Pamplona, organizadora do Círio no Lavrado, compartilhou sobre o sentimento de devoção que move essa manifestação: “Olha, o Círio esse ano foi de muita fé, uma caminhada verdadeira. A gente teve dificuldade, né? Todos os anos tem, pelo transporte, pela seca que tá muito grande... mas a caminhada foi boa, muitos devotos.” 

O Caminho da Procissão e a Força da Comunidade
O Círio de Nossa Senhora de Nazaré no Lavrado começa tradicionalmente na casa de um dos moradores da comunidade, que também é parte da organização. De lá, a procissão avança em um caminho de devoção até o centro da comunidade, onde normalmente a capela seria o ponto de chegada. Com a capela em reforma, a escola do Lavrado acolheu este ano o final da procissão, adaptação pensada pelos organizadores e participantes buscando manter viva a celebração. Essa demonstração de fé, além de fortalecer os laços locais, mostra como a população adapta-se para que a tradição nunca seja interrompida.

A vereadora de Ponta de Pedras, Mirna Zarpellon, que participou pelo segundo ano consecutivo, também compartilhou sua admiração e preocupação com os desafios enfrentados pela comunidade. Ela ressaltou o valor dessas manifestações religiosas: “Eu acho muito importante para a construção humana e para o nosso dia a dia. A gente não pode deixar essa tradição morrer, porque é uma forma de estarmos juntos, apoiando essa gente que tem uma fé tão bonita.”

Acompanhamento e Desafios da Programação
O Padre Carlindo, pároco da Paróquia Nossa Senhora de Nazaré, em Santa Cruz do Arari, acompanha o Círio no Lavrado há vários anos e observa de perto os desafios enfrentados pela comunidade para manter a celebração. Segundo ele, a tradição religiosa precisa de equilíbrio com as atividades culturais, como a corrida de cavalo, que acontecem no mesmo dia e interferem no andamento do Círio. “O objetivo principal do Círio é fortalecer a fé e a devoção a Nossa Senhora de Nazaré. A corrida de cavalo e as festas são importantes para a cultura local, mas é necessário que não interfiram de forma negativa na procissão”, destacou o padre.

A celebração do Círio no Lavrado inclui não apenas a procissão principal, mas também outras atividades que atraem e envolvem a comunidade. Um dia antes da principal procissão, ocorre a transladação, em que os fiéis fazem o percurso no sentido inverso, preparando-se espiritualmente para o Círio. No entanto, o horário da corrida de cavalo e as festas noturnas acabam dificultando a realização do evento religioso em alguns momentos. “Nós temos batizados e a transladação no sábado à tarde, e quando chega o horário da procissão, muitas pessoas estão na corrida de cavalo ou ficaram até tarde na festa, o que impacta a participação na procissão”, observou o padre Carlindo.

Sugestões para Fortalecer o Círio
Padre Carlindo propõe mudanças para que o Círio e as atividades culturais coexistam sem prejudicar a celebração religiosa. “A corrida de cavalo poderia ser realizada na manhã de sábado, evitando o conflito de horários com a procissão. Além disso, seria importante um apoio maior do poder público para ajustar esses eventos. Caso houvesse um decreto judicial, por exemplo, proibindo a festa durante a dimensão religiosa, isso ajudaria a preservar a tradição”, sugeriu ele.

A vereadora Mirna Zarpellon também destacou a necessidade de ajustes devido ao clima da região, com a possibilidade de iniciar a procissão mais cedo para evitar o calor intenso. “A procissão poderia sair um pouco mais cedo, porque o sol é muito forte, e o calor deixa a caminhada exaustiva. Esse ano, senti o clima mais quente e seco do que no ano passado. Esse é um detalhe que, se ajustado, pode ajudar muito”, comentou a vereadora.

Uma Celebração que Mobiliza e Inspira
A força do Círio de Nossa Senhora de Nazaré no Lavrado pode ser medida pelo número de pessoas que ele atrai. Este ano, a celebração contou com visitantes de diversas partes, incluindo Cachoeira do Arari, Muaná, Ponta de Pedras, Santa Cruz do Arari e até Belém, capital do Pará. Esse fluxo de visitantes demonstra a importância regional do evento, que vai além dos limites do Lavrado e reforça a identidade cultural e religiosa do Marajó.

Para Leila, essa manifestação é essencial para a cultura local, mas ela aponta que ainda há uma falta de reconhecimento e apoio das autoridades. “Hoje, falei com os representantes da prefeitura, a prefeita Consuelo, o vice Sandoval e a vereadora Mirna, sobre essa situação. A gente precisa de apoio, porque já conversamos várias vezes tentando mudar isso, mas a festa é da Santa, é dela, então nosso horário precisa ser respeitado”, explica a coordenadora.

Desafios e Necessidade de Apoio
Embora o Círio de Nossa Senhora de Nazaré no Lavrado seja uma manifestação marcante e resistente, ele enfrenta desafios que ameaçam a continuidade e a qualidade da celebração. A falta de apoio político e financeiro é um dos principais obstáculos. Para garantir que o Círio mantenha-se forte e seguro para todos os participantes, são necessários recursos que viabilizem melhorias na estrutura e na organização, desde o transporte dos visitantes até a manutenção de espaços de celebração e venda de alimentos típicos. 

Mirna Zarpellon, que diz que busca fortalecer a relação entre a comunidade e o poder público, falou sobre as condições de infraestrutura e a resiliência dos moradores locais: “Essa é uma terra muito difícil, no verão parece o deserto do Saara. Eu frequento esse lugar desde quando meu esposo era vereador, e agora ele é vice. São muitos anos de luta, e eu vejo o esforço dessa gente para manter essa tradição viva.”

Conclusão
O Círio de Nossa Senhora de Nazaré na comunidade do Lavrado é muito mais do que uma celebração religiosa; é uma expressão de fé, identidade e resistência cultural. Ao longo de quase três décadas, essa tradição tem reunido famílias, amigos, moradores e visitantes em uma demonstração de devoção que ultrapassa fronteiras. No entanto, para que esse evento continue a inspirar e unir as gerações futuras, é essencial que receba apoio e reconhecimento, fortalecendo sua organização e garantindo que o legado do Círio no Lavrado permaneça vivo para as próximas gerações.

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